sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014


                                                     MORTE DE SEPÉ TIARAJU!

                Antes mesmo de se descobrir a América, havia sido estabelecida a Linha de Tordesilhas para dividir as futuras possessões de Espanha e Portugal em outros continentes. A imprecisão desse meridiano, bem como a fusão das coroas de destes dois Países de 1580 a 1640, haviam contribuído para a caducidade daquele acordo e para a necessidade de se fixarem limites mais nítidos.

A situação se tornara mais confusa na ampla região à margem esquerda do rio Uruguai: aqui se alternavam a Colônia do Sacramento (portuguesa), o Governo Militar de Montevidéu (espanhol), a Comandância Militar de Rio Grande (portuguesa) e os Sete Povos das Missões Orientais (espanhol). Igualmente confusa, era a situação nos antípodas, isto é, no “outro lado” do globo terrestre.

                Pelo tratado de Madri, de 1750, as Filipinas e as Ilhas Molucas, no oriente e a Colônia do Sacramento, na América, passariam definitivamente ao domínio espanhol, recebendo Portugal, da Espanha, os Sete Povos das Missões Orientais do Uruguai. Da mesma forma que os habitantes da Colônia, teriam que se mudar para as terras portuguesas, por exemplo, a vila de Rio Grande,  os missionários e índios dos Sete Povos, teriam que se mudar  para as terras espanholas,  por exemplo, a outra margem do rio.

Nesse sentido, o art. XVI era bem claro, permitindo que os missioneiros levassem seus móveis e semoventes, armas, pólvora e munição, mas determinando  que,  a entrega das povoações à coroa de Portugal seria com todas as suas casas, igrejas, edifícios, propriedades e posse de terra.

                Para a demarcação de limites, foi constituída uma comissão mista, integrada por técnicos e militares de ambas as nações, tendo como representante espanhol, o Marquês de Valdelírios e como representante português, o general Gomes Freire de Andrada. Simultaneamente, casais açorianos, foram destinados, por Portugal, a povoar as terras que os índios abandonassem.

                Entretanto, houve a reação missioneira. Negando-se a abandonar o território, os índios iniciaram umas escaramuças contra os demarcadores e dentro em breve estourava a chamada “Guerra Guaranítica”, com junção dos exércitos de Espanha e Portugal, em dezembro de 1755, para a marcha contra os Sete Povos.

                Eram mais ou menos 2000 os combatentes espanhóis, sob a chefia do governador de Buenos Aires, D. José Andonaégui, e contando com a presença do governador de Montevidéu, José Joaquim Viana. Eram cerca de 1600 os soldados portugueses, sob o comando do general Gomes Freire. Juntaram-se na altura da atual Bagé. “Distavam uma 90 léguas das reduções”, escreve Mansueto Bernardi, “e em princípios de janeiro, começaram a avançar com extrema lentidão”. E os índios? “Demoravam inativos, cegamente confiantes no seu número, na sua bravura pessoal e nos seus santos”.

Não se prepararam seriamente para a resistência e apenas uns 300 deles, ao mando de Sepé Tiaraju, corregedor de São Miguel, se reuniram para embargar o passo dos invasores. Às patrulhas avançadas dos expedicionários, perguntaram os índios o que buscavam nas suas terras. Pouco depois, o próprio Governador Viana encontrou um piquete de índios que repetiram as perguntas anteriores. Como o governador de Montevidéu insistisse em prosseguir, os índios deram de rédeas aos seus cavalos dizendo: “no caminho nos encontraremos”. E assim, de fato, sucedeu. No dia 7 de fevereiro de 1756, houve diversos encontros e tiroteios isolados, sendo mortos diversos portugueses que, imprudentemente, se haviam afastado das guardas avançadas.

                 A descrição mais detalhada dos acontecimentos está na História do Brasil de R. Southey, vol.6, pag. 48 e 49.

                “Em consequência disso, teve o governador de Montevidéu, Viana, a ordem de sair com 300 homens a castigar o inimigo. Constando, ser este em grande número, enviou-se segundo destacamento, de 500 praças, a apoiar o primeiro. Mas, antes da chegada do reforço, tivera lugar uma peleia em que tombou Sepé Tiaraju.

Caiu como um valente. Um cavaleiro português o feriu com um lançaço, quando o cavalo do caudilho missioneiro, rodou num buraco de tatu, mas não sem receber também um ferimento. E talvez que Sepé ainda se erguesse e se salvasse se Viana não o houvesse morto com um tiro de pistola, ali caído”.

                A tradição popular engrandece a figura de Sepé Tiaraju, conferindo-lhe o grau de santidade, de certa forma oficializada pela toponímia: “São Sepé” é nome de um rio, de um município, de uma cidade nossa. A legenda desse índio-mártir tem sido alimentada, em prosa e verso, através das gerações e hoje sua força mitológica é associada à resistência latino-americana contra o domínio colonialista europeu.

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