quarta-feira, 27 de junho de 2018


                                                               PRENDA MINHA!
                Encontrei-te no negrume da noite prenda minha, rosa do meu rincão. Teu olhar meigo me fascina como outrora já o fez e essa meiguice que trazes vem da tua alma límpida e pura que confrangeu meu coração.
                “Abre o poncho dessa alma, prenda minha que eu preciso me abrigar”, versos do poeta que encantam o velho peão cansado de lutas férreas em defesa da querência. Ronca a oito socos lá no fundo do rancho pedindo uma dança, daquelas de levantar poeira e recordo de tempos idos, quando amanhecíamos nos fandangos que, enquanto não se via o sol no horizonte, não acabava.
                Hoje os fandangos viraram bailes e os ranchos e galpões se tornaram bailantas onde até se dança de cola atada. Os grupos musicais, antes autênticos representantes da nossa música, tocam de maxixe pra cima para agradar os que estão chegando, esquecendo as virtudes dos templos sagrados, na vilania da busca de algumas patacas, pra encher as algibeiras dos tradicionalistas de plantão.
                Por isso, prenda minha te convido pra mais um fandango a moda antiga, de gaita violão e pandeiro com som ambiente, onde as famílias se reencontram para mais um rodeio de emoções, onde os corações se irmanam, nos mesmos ideais.
                As valsas, vaneiras, mazurcas, rancheiras, chotes, inclusive o de Duas Damas, se houver pouca prenda, marchas incluindo aí a Quadrilha, como dança de Minueto, como se fazia nos salões antigos do século dezenove em Paris, e no meio de tudo se provocava e se saia para o Rilo, dança da Vassoura, dança do Espelho, Meia Canha onde se namorava através dos versos e tantas outras brincadeiras de galpão, que unia as pessoas numa grande confraternização.
                Com tudo isso preparado prenda minha, vamos louvar a volta da tradição, já tão longe e abandonada por interesses mesquinhos e sub-reptícios que enodoam o passado desvirtuando o ensinamento de nossos avoengos, que estão loucos para levantarem-se de seus túmulos para dar um basta e dizer de novo como o velho Sepé. “Esta terra tem dono”.
                A prenda me dá a honra desta contradança?
Pensemos nisso!
ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS – Tradicionalista.

quinta-feira, 21 de junho de 2018


                                                           ORELHANO!

                Toca o compasso parceiro velho porque cada pisada é uma marca indelével na essência do vivente, teatino por natureza, cujo rancho é o próprio pampa com seu céu estrelado.
                Abrindo caminho nas tigüeras da ida sem rumo certo, tem seu destino a cada dia traçado e a galopito no más, sofreneia o corcel, parceiro cotidiano da vida errante, que já conhece seu dono pelo montar e pelo olhar perdido no horizonte.
                Mas o ritual dos fogões fulgura imponente em sua mente, quando pensa na china que ficou pra trás em recordações, como ave que voa e que sempre volta ao ninho. No entanto, ela não voltou e um gosto amargo de abandono retorce sua boca num esgar, profligando seu ânimo na penca da existência vazia.
                Ah vida orelhana! Que não precisa passaporte por andar a esmo com seu laço enrodilhado a espera de um pretérito saudoso aonde chegava à estância e via a cachorrada que o recebia em festa, sua mãe rindo e o abraçando, pela volta do filho pródigo à casa que o viu nascer.
                Contudo, pelos corredores dos alambrados ele perdeu-se e não consegue achar seu caminho de volta, prolatando descaminhos na aspereza das urzes do estradeiro, que esconde o iminente despenhadeiro como abutre que sobrevoa sua presa disforme.
                Que fim bucólico do guasca tapejara de outros tempos, que foi taura em diferentes guerras, revoluções e escaramuças de toda ordem!  
Acabaram os tempos e ele tomba inerte sobre as encilhas, suas mãos crispadas não soltam as crinas do pingo, que no despacito segue a jornada até o final. A ave sonora faz sua despedida no clarim campeiro quando do toque de silêncio, que cala fundo na noite soturnal, do desvanecimento total! Assim é a vida!
Pensemos nisso!
ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS – Professor e tradicionalista.

sábado, 16 de junho de 2018


                                                     SAUDADE REDOMONA!

                O sol da tarde caindo, bem lindo o céu nessa hora que a luz do dia vai mermando, mermando, até cair de todo no horizonte fugidio!
                É a solidão da campanha do guapo de antanho, que assombra de quando em vez a alma rude, mas o chimarrão não o deixa sozinho e no tição da brasa acesa, na trempe da saudade, suas mágoas desabafa.
                Deixei para trás horizontes e na busca de novas fontes, desenfreado saio. Um dia, cantarei de novo a beleza deixada, a do largo e meu mate de espera terá companhia no jujo da maçanilha enfeitando como china caborteira, a vida do peão!
                Meu catre não estará mais vazio e os pelegos aquecerão meu corpo cansado das lides dos viandantes sem rumo e de destino incerto. Sou parte da querência como centauro de homem-cavalo em um só, na memória do índio vago, que erra pelas coxilhas e canhadas infindas, no trote do pingo aguaxado.
                Aos coices, meu coração me leva a lugar algum, pois não vejo mais o verde dos campos. Meu rancho virou tapera e a coivara tomou conta dos lugarejos e vilas das minhas saudades!
                Aos arrancos da lembrança, repuxos e um gosto amargo na boca, sobressaem das agruras que tento cabrestear, mas, nas dificuldades dos retouços da vida maleva, que escoiceia sem parar como cavalo redomão, changueio sentimentos no flete fogoso da esperança, que me trás novo alento!
                Na bruaca, escondo os escolhos da vida secas que são restolhos da pregressa existência vã, que se esvai nos rios, que são lágrimas que de tão salgadas, formam novos mares, nos recônditos imersos na chucresa da vida gaviona.
                Assim é a vida que segue, na utopia de novos rumos mais alvissareiros, na cancha reta da carreira que se perde nos escombros da saudade redomona!
Pensemos nisso!
ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS- Professor e tradicionalista.
(Email, toninhosantospereira@hotmail.com; Twiter, toninhopds; Blog, WWW.allmagaucha.blogspot.com).



quinta-feira, 7 de junho de 2018


                                                  O PENSAMENTO!

Na escuridão da noite, me vejo pensando, desorientado. Não consigo achar um norte para esta fase da minha vida. O que foi feito, está feito, não tem como reparar mais nada.
Será que valeu a pena tanto esforço? Para que afinal? Os teus próximos, já não são mais tão próximos. Uma grande parte, já partiu para a estrada infinda.
Teus feitos, ninguém mais lembra e a solidão toma conta do ser. Não vê mais finalidade do seu existir!
Diante desta reflexão, infiro do por que tantas pessoas se atiram às drogas, largam suas casas e vão morar nas ruas! É o entorpecimento da própria alma, que aturdida, fica sem azimute, no perigoso fio da sanidade e da loucura. Ah! A mente com suas elucubrações e ainda indefinida para estudiosos e cientistas. Qual a explicação afinal? Por que grande parte da humanidade se sente assim?
É preciso escutar dentro de si próprio. Na realidade somos o efeito de nossos pensamentos. Por isso, faz mister emitir bons pensamentos, afim de armazenar energias positivas. É como a sintonia de radio ou televisão. Escutamos ou vemos o que escolhermos.
Pensamentos são coisas vivas e nos influenciam muito mais do que imaginamos. Cultivemos, pois bons sentimentos e não precisaremos ficar acabrunhados, na soledade da inércia e do mundo vazio em que, por vezes, nos encontramos.
Pensemos nisso!
       ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS- Professor e tradicionalista.
    (Email, toninhosantospereira@hotmail.com; Twitter, toninhopds; Blog, WWW.allmagaucha.blogspot.com).

sexta-feira, 1 de junho de 2018


                                                              EU VI!

Eu vi, em 30 de maio de 1431, Joana D’Arc ser queimada na cidade de Ruão (França) aos 19 anos de idade, por ordem da Inquisição Inglesa, que a acusou de heresia e bruxaria. Ela foi canonizada em 1920.
Eu vi a chamada Idade Média, mil anos de escuridão, quando uma simples desconfiança, os fiéis súditos eclesiásticos faziam valer sua autoridade em nome de um Cristo vingativo e cruel. Foram no mínimo milhares de mortos sob o fogo, para expurgar o demônio.
Eu vi, chegar a Idade Contemporânea e com ela nos dizemos pessoas inteligentes. Eu vi irmos à lua, conquistarmos o espaço, estarmos em pleno tempo quântico, criarmos clones de nós mesmos. Eu vi nos comunicarmos instantaneamente com todo o planeta e nos concebermos, como ser humano, na acepção legitima da palavra.
Eu vi os últimos dias, no entanto, cenas da idade média. Em toda a nossa Pátria, chamada do Evangelho e por muitos, considerada “coração do mundo”, eu vi como dantes muitos viram, o dantesco surgindo, como se tivéssemos voltado ao passado longínquo da inquisição romana.
Não, ninguém foi queimado em fogueira atroz visível a olho nu. Mas eu vi línguas de fogo da inquisição hodierna a cuspirem sua ira e sua violência numa vil e ferina acusação de “heresias” dos novos tempos.
Eu vi, o vilipêndio que sofreram as pessoas que foram também humilhadas porque queriam colocar combustível em seus carros e motos, numa acusação de anti-patriotismo, de ignorância, de covardia e outras palavras impronunciáveis.
Eu vi o julgamento do pretérito voltar e senti de novo na própria pele o queimar do fogo inclemente a dilacerar as carnes num gozo impar dos algozes!  Seremos os novos juízes da inquisição? Nas dificuldades se conhecem as pessoas. Quem sabe os problemas de cada um! Quantos ali estavam, porque precisavam levar seu filho numa viagem urgente para um transplante, por exemplo. O drama individual das famílias? Ah quem sabe... não eles eram a ralé do povinho.
Eu vi o meu povo transformado e transtornado no primeiro obstáculo encontrado, eu vi as trombetas a tocarem o hino do Aqueronte, o rio da morte, no desespero da vida a esvair-se.
Eu vi e fiquei acabrunhado, triste... os  rostos crispados dos meus irmãos que me fez sentir o antanho irracional, que já vivemos e que deveríamos ter extirpado do nosso imo!
O Cristo disse: “Não julgueis para não serdes julgados”. O amor é o meu dardo!
“O olho por olho e dente por dente” não cabe mais. Por isso, sejamos fraternos, façamos a nossa meia-culpa, busquemos a paz que tanto almejamos e que, às vezes, nós mesmos nos afastamos dela.  Pensemos nisso!
ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS – Professor e tradicionalista.
(Email, toninhosantospereira@hotmail.com; Twitter, toninhopds; Blog, WWW.allmagaucha.blogspot.com).