CANTO
TRISTE!
Reacendendo a brasa, na invernia
das enregeladas madrugadas da pampa insalubre, rasgando a geada com pés duros, como
tronco de angico, acostumados às intempéries de menino criado no campo, nos
costumes simples que seus ancestrais lhe colimaram na energia estoica que passa
de pai pra filho.
Ressongando no fundão da
invernada, um canto triste, com a própria definição do gaúcho, se faz ouvir
como num chamamento a angustia da cordeona e nos bordões de uma viola bem
afinada, no sentimento da última lembrança que ficou acolá.
Viverei, através dos cantares da
vida temporal, que se esvai numa miríade de ilusões que ainda impera na
melancolia do trinar da cotovia, anunciando a invasão de seu ninho.
Por estranhas figuras aladas
incompreensíveis à realidade atual, vejo meu pai agora à porta, cuja silueta se
recorta com imponência de taita. Ele quer me abrigar com seu poncho, mas, com
olhos marejados de lágrimas, sinto fugir essa imagem. Será miragem? Mas ele
estava bem ali!
Volto os tempos novamente e na
fulguração de irradiações plenas, novamente se aclarou a mente e sua presença
marcante é novamente sentida com sua voz clara e compassada acalmando quem a
escutava. Quantas histórias...
Coração apertado, acordo para a
realidade dura e fria da madrugada tenebrosa. Quero sonhar novamente para
encontrar minha mãe. Relembro dela na cozinha, o avental todo sujo de ovo, como
diz a canção, com aquele seu jeitão de matrona onde recebia todos no seu
regaço.
Ah... Mamãe! Queria voltar tudo,
tudo de novo. Sentir tuas mãos passando sobre meus cabelos, altas horas da
noite, teu aconchego acalmava toda ventania. Não havia furacão que a vencesse.
Mãe é o
próprio DEUS na terra, seu mais lídimo representante.
Num
sofrenaço acordo definitivamente, foi tudo um sonho! Mas foi divino. Estou
feliz novamente por esse reencontro.
Quer possamos finalmente ser um
fiapo do que foi José e Maria para que nossos descendentes amanhã recordem com
saudades os momentos felizes que nunca se apagarão e viverão como uma sombra em
sua sombra e o canto triste do guapo atávico será o lenitivo na grande jornada
da existência!
Cantemos, pois, a vida!
ANTONIO
PEREIRA DOS SANTOS-Professor e tradicionalista.
(Email, toninhosantospereira@hotmail.com; blog, WWW.allmagaucha.blogspot.com; twitter, toninhopds
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